Cães vadios

A solidão é uma coisa estranha sabes. Quando estás sentado ao meu lado e a minha cabeça viaja sinto-me tão longe de ti como se estivesses a milhas de distância. Hoje não é o caso. Tenho a cabeça bem aqui, em cima dos ombros, colada ao pescoço. Abro o roupeiro só para ser invadida pelo teu cheiro. Durmo colada à tua almofada. Uso as tuas expressões. E embora saiba que vai ser por pouco tempo, parece que tenho uma eternidade à nossa espera. Mas o que me deixa mais triste é saber que não vou conseguir transmitir-te isto quando voltares para mim. Vou abraçar-te, sentir o teu calor de sempre, mas será tudo o que te vou dar de mim. Chama-me fria, chama-me bruta, chama-me a tua menina. Não sei se o sou. Mas quero. Queria saber dar-te mais de mim como no passado. Queria não ter medo de saíres porta fora e ficares a ganhar. Sou, no fundo, um cão rafeiro. Daqueles que são abandonados pelos donos, habituam-se ao frio do alcatrão à noite, a desconfiar de quem lhes dá de comer e fogem sempre que se aproximam. Não foste tu que me abandonaste. Não foste tu que me atiraste do carro em adamento para o meio da estrada. Mas és tu que lidas com as consequências disso. Lembra-te só que a minha reacção não se deve a gostar menos de ti do que tu de mim, os cães vadios atacam quando têm medo. E eu sou uma rafeira vadia que prefere morder-te a deixar-te abandonar-me.

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O meu nome é Joana. Sou insatisfeita por natureza, quero sempre mais e sempre melhor. Sou indecisa, mas quando me decido vou até ao fim do mundo. O meu sonho é fotografar o mundo e as coisas bonitas que nos rodeiam. O meu grande sonho é não ter limites para o fazer.